Prazo inviável para o switch-off

Faltando menos de quatro meses para o desligamento do sinal analógico de TV na cidade-piloto de Rio Verde (GO), as retransmissoras que levam as programações da Record e da Band ao município não estão nem perto de estarem digitalizadas. 

A jornalista Lúcia Berbert, do TELA VIVA News, apurou que as duas estações pertencem à prefeitura local, que não têm os recursos humanos e financeiros necessários para digitalizar o sinal. Sequer consegue entregar ao Minicom a documentação necessária à requisição do canal consignado. São procedimentos que demoram meses para ser realizados.

A situação, diz a reportagem (na íntegra aqui), se repete em várias cidades onde as prefeituras têm o papel de gerir as outorgas de retransmissão. Segundo a Anatel, há 3,2 mil registros de retransmissoras de TV em nome de prefeituras, além das que estão em nome de associações, fundações e de Câmaras de Vereadores. E há ainda as que funcionam sem nenhum tipo de formalização, com transmissores ligados clandestinamente.

Segundo fontes do mercado de radiodifusão, haveria mais de 4 mil pedidos de consignação de canais digitais à espera da liberação no Minicom, não só de prefeituras, mas também empresas comerciais, número não confirmado oficialmente pelo órgão.

Nas contas da Abert, associação de emissoras comerciais, existem no País 13 mil retransmissoras, incluindo as 2,5 mil que funcionam sem autorização, e apenas 5 mil estão digitalizadas. Os dados oficiais do Minicom falam em 10,7 mil retransmissoras e 543 geradoras, mas não há dados sobre quais já têm o canal digital consignado ou já digitalizado. Em Brasília, que terá (terá?) o sinal analógico de TV desligado em abril de 2016, há notícias de que oito retransmissoras também não estão digitalizadas ainda.

As dificuldades não param aí. O desafio de mensurar a recepção de TV digital em no mínimo 93% dos domicílios em cada cidade, requisito para o desligamento, é enorme. Há toda a questão da distribuição de caixas aos usuários do Bolsa-família, mas há também outras milhares de pessoas fora do programa, que terão que ser instruídas a comprar e instalar os equipamentos.

O modelo brasileiro de TV digital adotou uma solução técnica impecável, sem dúvida a melhor do mundo em qualidade de recepção. Mas deixou de lado todas as outras questões, da multiprogramação à interatividade. Perdeu-se a chance histórica de se repensar um modelo para a radiodifusão, e acabou-se com canais digitais em cidades como São Paulo alugados a igrejas neopentecostais.

Agora se imagina que tiraremos o atraso e faremos um desligamento no prazo planejado. As teles, que estão pagando a conta, vão pressionar, porque querem as frequências que serão liberadas. Mas é difícil acreditar que cidades como São Paulo, Rio de Janeiro ou Brasília tirarão a TV analógica da tomada nos próximos dois a três anos.


POR ANDRÉ MERMELSTEIN | andre@convergecom.com.br